Cantor Netinho revela sua vida e carreira numa entrevita exclusiva.
Por: Felipe Souto Maior
Quem nunca pulou ou acompanhou o cantor Netinho em micaretas pelo Brasil ou no carnaval em Salvador? Um dos grandes idealizadores do movimento axé, e considerado um dos melhores puxadores de trio elétricos durante anos, o cantor volta com força ao axé music sem nunca esquecer suas raízes, na qual se consagrou como cantor.
Netinho iniciou sua carreira aos 16 anos cantando em bares, no ano de 1988, participou de um teste para entrar na Banda Beijo, passou então foi aí que começou a sua carreira brilhante, 5 anos depois ele deixa a Banda Beijo para seguir carreira solo, e ser reconhecido internacionalmente.
Em entrevista EXCLUSIVA ao Jornal Espalha Fato, o cantor rasga o verbo e fala sobre tudo. O começo cantando em bares, o teste para entrar na Banda Beijo, a visão sobre o axé music, o preconceito sobre o axé, nova geração dos músicos do axé, entre outros temas abordados.
Antes de começar essa entrevista, gostaria de agradecer ao cantor Netinho e toda sua produção, em especial a Tita.
Jornal Espalha Fato: Netinho, assim como outros cantores, você também começou cantando na noite de Salvador. Como surgiam os contratos/convites?
Netinho: Eu já tocava violão e sempre saía com amigos e com meus irmãos mais velhos. Um dia, num bar no Rio Vermelho, dei uma “canja” cantando algumas músicas e o dono do bar quis me contratar. Eu tinha 16 anos, acabara de entrar na Universidade de Engenharia (UCSAL), e aceitei o convite contra tudo e contra todos. Foi o início de tudo.
JEF: Em 1988, nascia em Salvador a Banda Beijo. Como você ficou sabendo dos testes para a banda que lhe levaria ao sucesso? Foi verdade que você chegou a concorrer com Daniela Mercury e Ivete Sangalo pela vaga na banda?
Netinho: Fiquei sabendo dos testes através de amigos músicos da noite. Não sei se Ivete e Daniela fizeram teste para a Banda Beijo. Penso que não.
JEF: Depois de cinco anos de sucesso à frente da Banda Beijo, em 1993, você resolveu deixar a banda e seguir carreira solo. Já que a banda era sucesso por onde passava, por qual motivo você resolveu sair e seguir carreira solo?
Netinho: Foi depois de cinco anos à frente da Banda Beijo e o convite para a carreira solo partiu da diretoria da gravadora Polygram, hoje Universal Music. Eles tinham argumentos fortes e eu acreditava naquilo. Queriam investir na minha carreira e então me joguei. Felizmente, tudo deu muito certo. Já no meu primeiro CD solo, ganhei Disco Duplo de Platina pela vendagem superior a 500.000 cópias.
JEF: Lembro que no Recifolia de 1994, um dos melhores blocos era o Leque Moleque, (bloco que você puxava em Recife). Enquanto você puxava três dias de folia, a Ivete Sangalo puxava apenas um dia de bloco alternativo, chamado Adrenalina. Ao longo de sua carreira Ivete fez algumas participações em seus shows, mas como surgiu a amizade entre vocês?
Netinho: Surgiu naturalmente. Nos conhecemos no ambiente do show bizz e uma amizade nasceu. Por gostar muito de Ivete, sempre a convidava para dar canja em meus shows e passei o tour do CD “Netinho Ao Vivo” falando dela em todos os meus shows, onde quer que me apresentasse. Anos depois, participei de um CD da Banda Eva cantando a música “Química Perfeita” com Ivete, em português e espanhol.
JEF: Em 20 anos do movimento axé music, não só o ritmo, mas as letras das músicas mudaram muito, antes o axé tinham letras maravilhosas e hoje em dia temos na grande maioria das bandas temos apenas palavras que combinam ou com duplo sentido, qual a sua visão sobre essas duas versões de axé?
Netinho: Nunca fiz uso de canções de duplo sentido em minha carreira. Prezo sempre pela qualidade musical e literária do que estou cantando para meu público. Gosto de cantar o amor, a alegria, o carnaval e o cotidiano. Penso que o Axé Music perdeu muito quando muitos artistas baianos incluíram em seu repertório canções apelativas e de duplo sentido. Sinto saudade do tempo em que as pessoas vinham para Salvador no Carnaval por causa das canções. Nossa música exaltava Salvador, tínhamos letras e melodias belíssimas. Hoje em dia todos vem pela festa, pela curtição apenas, enquanto a música se transformou em um mero acessório de toda a festa. Até nossa posição em execução de rádio no Brasil nós perdemos. Uma pena. Mas vamos trabalhar e reverter esse quadro. Já estou fazendo a minha parte.
JEF: Será que todo esse preconceito com o axé não foi por conta das bandas que banalizaram o movimento?
Netinho: Sem dúvida. Alguns empresários acham que apenas peito e bunda bonitos vendem música. Um grande equívoco. Podem vender naquele momento pois existe o apelo sensual e até sexual para o público consumidor. Mas não torna a obra perene. Para se construir uma geração musical consistente, um estilo musical que dure, tem que haver qualidade.
JEF: Qual o conselho que o cantor Netinho deixa para os novos cantores da axé music, e qual cantor da nova geração você aposta em um futuro brilhante?
Netinho: Não gosto de dar conselhos, gosto de conversar e desossar esse assunto. Como não temos espaço e tempo suficiente aqui, fica apenas a esperança de que tanto os artistas da minha geração quanto os que estão vindo por aí saibam conduzir a nossa música com cuidado e amor, preservando a estética, a qualidade literária e musical das canções e do seu trabalho. Quanto aos novos, estou de olho neles. Ainda é cedo para citar alguém aqui e não quero ser injusto com ninguém por omissão.
JEF: Qual cantor de antigamente da axé music, que você acha de deveria voltar a ativa?
Netinho: Quem eu queria, já voltou. Luiz Caldas. Além de ser um grande músico em excelência e talento, é uma pessoa bacana, leve, boa gente mesmo. Antes de ser cantor da Banda Beijo cheguei a desfilar como folião no Bloco Beijo ao som de Luiz Caldas & Acordes Verdes. Foi um carnaval inesquecível
JEF: Com o passar do tempo, o axé vem aparecendo com novas fases, temos o axé eletrônico da Daniela Mercury, o pop da Ivete Sangalo, o afro da Margareth Menezes, o rock do Cheiro com Alinne Rosa, o humorístico do Asa entre outros, qual a versão que o Netinho levará?
Netinho: A minha versão é a “Versão Netinho”. Meu axé é marcado pelo meu jeito suave de cantar, pela escolha do meu repertório, pelo meu axé cruel na condução dos trios elétricos, pela qualidade dos meus discos e pela estética dos meus shows. Farei 20 anos de carreira e já fiz de tudo um pouco. Em 1991 tive minha versão eletrônica com o CD “Badameiro” da Banda Beijo em que usamos apenas instrumentos eletrônicos em uma época em que o padrão era o acústico. Fomos totalmente na contra mão. O pop sempre esteve presente no meu trabalho através dos arranjos inovadores e das canções românticas que eu sempre gravei. Só para novelas da Globo foram oito. Também o afro sempre esteve presente em todos os meus discos, não através de temas ligados ao Candomblé, mas através da percussão. Na verdade, é uma característica dos artistas de trio elétrico essa permissão de influências, esse experimentalismo que nada mais é do que uma ânsia em mostrar algo inovador. Continuo usando essa permissividade, inclusive agora no meu DVD que está para ser lançado.
JEF: Como toda volta, tudo é muito difícil, você tem encontrado alguma barreira com sua volta, seja ela com um público um novo ou com alguma produtora?
Netinho: De forma alguma, está tudo lindo. Nasceu este ano uma parceria entre a minha empresa, a ME, e a Caco de Telha, onde estamos juntos no trabalho de discos, shows e carnavais. Estou bastante empolgado e feliz.
JEF: Falando na Caco, Como surgiu a parceria entre a sua produtora e a Caco de Telha discos?
Netinho: Surgiu numa conversa com Ricardo Martins, num restaurante em Salvador. Na verdade, buscamos uma empresa idônea para terceirizar o agenciamento dos meus shows e da minha imagem. A Caco foi a nossa primeira opção, até pela minha ligação com Ivete e com seus irmãos Jesus e Ricardo Sangalo. Temos uma sintonia na maneira como sentimos e tratamos a música. Percebo isso. E isso pra mim é o mais importante!
JEF: Como você tem notado, as micaretas do Brasil não têm mais o pique que tinham antes, em muitos estados nem existem e as poucas que tem estão virando Indoor, porque você acha que as micaretas estão acabando e qual a sua visão entre projetos como Indoor, Cerveja & Cia Folia, Trivela e Babado elétrico? Futuramente você lançará algo do tipo?
Netinho: Vejo isso tudo como uma evolução. Com causas claras. Estive presente como artista na fundação de vários carnavais fora de época como o Recifolia, o Carnatal, o Pré Caju, etc. Fui o primeiro artista baiano a desfilar com um trio elétrico na Avenida Atlântica no Rio de Janeiro. Fui o primeiro artista brasileiro a levar um trio elétrico montado para fora do Brasil, no caso, para a Itália. Sou fundador do primeiro Portugal Elétrico, em Portugal. Enfim, já vi e fiz muita coisa acontecer. Esse tipo de evento, o carnaval de rua com trios elétricos, é invasivo quando entra na rua e na casa das pessoas com o som e a confusão, sem pedir licença. Conseguimos fazer isso em qualquer cidade enquanto tivemos poder. Enquanto éramos vistos realmente como uma “geração”, como um movimento. Éramos muitos. O brilho artístico dessa “geração” chamava mais atenção do que o lado comercial dessas festas. Todos os blocos vendiam e a festa era boa para todo mundo. No início da década de 90 a música baiana estava no seu auge e as micaretas explodiram em todo o Brasil. Detínhamos os primeiros lugares de execução em rádio de todo o pais. Éramos campeões de audiência na TV em programas musicais. E a nossa música ainda representava algo inovador no mercado musical e fonográfico. Com o passar do tempo, os interesses externos nesse tipo de evento cresceram, inclusive os interesses políticos. Ao mesmo tempo a nossa música foi perdendo qualidade e os artistas se repetiam. Passamos a freqüentar menos a TV. As vendas de discos despencaram. Dessa forma ficamos sem o poder e não conseguimos manter o status dos carnavais. Apenas dois ou três blocos passaram a vender completamente e concentraram assim os lucros dos eventos. Isso chamou atenção e aqueles interesses dominaram a cena. Os carnavais foram relocados, alguns várias vezes. Em muitas cidades a própria população não queria mais o carnaval em determinado local. Quem algum dia imaginaria isso? Passamos a incomodar, a encher o saco. Lembro com saudade do tempo em que, durante as micaretas, toda a cidade parava. Todo mundo se envolvia com o evento. As pessoas queriam ir para a rua e ver todos aqueles artistas. A multiplicidade e diversidade eram a nossa galinha dos ovos de ouro nesse tipo de evento. Acabou. Agora estamos In Door. Em out door agora só as propagandas mesmo. Mas ainda temos o Carnaval de Salvador para brincar como antigamente. E ele é aberto a todos.
Apesar de tudo isso, vejo os eventos In Door como uma evolução em diversos aspectos. Os principais são a segurança, o conforto, e a organização. Quem ganha na verdade é o folião. Este ano participarei de alguns Cerveja & Cia Folia. Estive com Ivete em Ribeirão Preto e foi muito bacana. Fiquei impressionado com a estrutura do evento e com a organização.
JEF : O seu DVD contou apenas com uma participação musical que foi a de Ivete Sangalo, sabemos o quanto vocês são amigos e admiram um o trabalho do outro, geralmente os músicos convidam três artistas, porque você não resolveu seguir essa linha também já que você tem outros grandes amigos na música?
Netinho: Além de Ivete Sangalo, tive também o Ilê Ayê como convidado especial. Optei por Ivete porque, além de amiga querida, ela representa toda essa geração dos artistas de trio alétrico. Já o Ilê veio como um autêntico representante da cultura negra da Bahia, o que temos de mais belo na nossa terra. Não quis convidar muita gente e penso que a Bahia musical do carnaval ficou bem representada nesse trabalho.
JEF: Correm boatos que você puxará um dia do Crocodilo no carnaval 2009, é verídica essa informação ou você já fechou com algum outro bloco?
Netinho: Não puxarei o Crocodilo. Esta informação não procede. Já fechei com o Bloco A Barca na sexta e Trimix, no sábado de carnaval. Estamos ainda em negociação para o domingo, a segunda e a terça de carnaval.
JEF: Com mais de 18 anos de carreira, quais as dificuldades para a escolha do repertório dos shows?
Netinho: Hoje em dia lido com tranqüilidade com isso. Tenho um repertório base e vou fazendo modificações a depender do tipo de evento ou do lugar. É bem tranqüilo.
JEF: O carnaval de Salvador vem crescendo a cada ano que passa, há boatos que existe a possibilidade da criação de um novo circuito. O que você dessa idéia e se construir um novo percurso?
Netinho: Acho a idéia muito boa para todo mundo. Precisamos desafogar o carnaval da avenida e também o carnaval da Barra que já está ficando complicado com tantos camarotes ocupando parte da calçada que antes pertencia ao folião pipoca. Um circuito alternativo ou um alongamento do horário do carnaval cairia muito bem nesse momento. Aposto nisso.
JEF: Um assunto incansável são os preços dos abadás que não param de crescer. Porque isso?
Netinho: Oferta e procura. São leis do capitalismo e não podemos discutir isso. O que precisamos é dar oportunidades de horário e espaço a TODOS os blocos para que possam competir em igualdade e oferecer um horário bom no desfile aos seus associados. Um circuito alternativo já ajudaria bastante. Acho errado não haver um limite de abadás para venda, por bloco. Acho errado não haver um controle rígido de horário no desfile para cada bloco. Acho errado não haver penalidades que se cumpram aplicadas aos desrespeitosos. Tem que haver respeito pois estamos em uma democracia e usamos ali um espaço público. E ninguém é dono do carnaval. Alguns blocos no início da fila se tornaram gigantes em tamanho e passaram a ocupar a avenida por horas prejudicando os blocos que estão mais atrás. Isso é ruim para o carnaval e para a transmissão de TV que fica monótona e cansativa. O povo quer ver num bom horário mais blocos, mais artistas, mais atrações.
JEF: Gostaria de agradecer sua atenção e simpatia em nos conceder essa entrevista. Desejamos muito sucesso na carreira.
Netinho: Repito, foi um prazer. Estamos juntos! Um abraço a todos.
Aproveitando o espaço queria divulgar o blog do cantor Netinho
Em breve será lançado o site oficial da nova turnê.
http://www.netinho.com.br/blog/
Entrevista: Felipe Souto Maior
Edição: Gabrielle Barros
1 comentários:
O bloco Adrenalina nunca foi alternativo do leque, o Adrenalina surgiu em 95 com Eva e Pimenta Nativa